Abriu no dia 21 de junho, no solstício de verão, depois de anos encerrada. Quem ali entra pela primeira vez, rende-se à forma como o espólio e a herança do antigo espaço de trabalho está preservado. «Isto sempre funcionou como ponto de encontro das pessoas de Aljezur. Os mais antigos falam da moagem com muito carinho e com muitas memórias. Estava em muito mau estado. Nós começamos a obra de reabilitação em janeiro deste ano e a ideia foi manter ao máximo possível, a traça original», conta Rita Belo, coordenadora e programadora cultural da «Moagem».
«As mós ainda funcionam, e pretendemos recuperar uma. Precisa de um grande trabalho de manutenção para poder voltar a moer farinha. A ideia seria, por exemplo, fazer demonstrações e visitas guiadas às escolas, poder mostrar às crianças todo o ciclo do cereal até ao pão. Temos também algumas ideias na área artística, com propostas para fazer teatro gastronómico», revela. A «Moagem» nasce por vontade de um grupo de amigos, sendo Diogo Ruivo, o instigador do projeto.
«Já trabalhámos juntos noutras ocasiões e, por coincidência, aconteceu nas nossas vidas que estamos todos a mudar-nos para cá. Eu sou do Porto, mas já vivi na vila da Bordeira e venho para aqui há mais de 30 anos. Um colega nosso está agora a tomar conta de um terreno da família no Rogil, e há muito tempo que falávamos na hipótese de abrir uma espécie de hub cultural em Aljezur. Temos todos muito interesse na cultura, na arte, na música e na dança, no desenvolvimento pessoal e na alimentação saudável. Entretanto surgiu a oportunidade de alugar este espaço carismático. Quer a Câmara Municipal, quer os proprietários acolheram muito bem a ideia. Já cá vieram e ficaram muito contentes com o resultado», diz Rita Belo.
«Começámos por criar a associação Moagem de Ideias, em janeiro, que pretende dinamizar toda a parte cultural e as parcerias. Dentro deste espaço, temos uma entidade à parte, o Mó Bistrô, que é um restaurante vegetariano», a cargo da chef Isabel Gonçalves. «Aqui a aposta é na comida fresca, saudável, utilizando produtos biológicos e locais o mais possível. Ofertas de carne e peixe já há muitas nesta zona. E a procura por uma boa comida vegetariana tem vindo a crescer, quer por razões ecológicas, de consciência, ou de saúde. A população estrangeira há mais tempo que adere, e cada vez mais portugueses também». Para já, «estamos abertos todos os dias, das 10 às 23 horas. À terça-feira abrimos ao final da tarde», para dar resposta aos muitos turistas que nesta altura visitam a Costa Vicentina. Durante o verão, «temos atividades regulares como yoga, dança com meditação em movimento, concertos de música ao vivo, Djs e palestras», conclui.
Wandergesellen, os carpinteiros alemães que ajudaram a recuperar o espaço
É uma tradição que remonta à Idade Média. Na Europa Medieval, quem aprendia um ofício, como carpinteiro, marceneiro ou pedreiro, fazia uma viagem de pelo menos três anos, por diferentes locais, a fim de praticar e ganhar experiência para se tornar «mestre». O aprendiz usava um traje para se reconhecer entre os pares e para evitar ser confundido por vagabundo. Dependia da ajuda das populações, para encontrar trabalho e sítios onde dormir. Ainda hoje há quem aceite o desafio. Foi o que aconteceu na recuperação da «Moagem».
«Uma das primeiras coisas que se fez foi pôr a descoberto uma parede lindíssima de pedra, que estava coberta por reboco. Tivemos a colaboração de carpinteiros alemães tradicionais, os Wandergesellen. Tivemos cá um grupo de três, que não se iam embora sem antes pedir a outros colegas para os substituir. Portanto, passaram por aqui cerca de 20, uns trabalhavam a madeira, outros a pedra. Ajudaram-nos muito, fizeram mesmo parte de todo o processo. Foram espetaculares», conta Rita Belo.
Até março, «o nosso escritório estava montado no edifício em frente, o Celeiro. Através do vidro conseguíamos ver o progresso da obra. Se a moagem, por si, já é algo curioso, as pessoas passavam e viam os Wandergesellen, paravam, perguntavam se aquilo era alguma performance, e se os trajes que usavam eram típicos de Aljezur», brinca.
Projetos para o futuro
Apesar do cuidado para conservar o espólio e integrá-lo na nova vida do espaço, também houve lugar para a criatividade. É o caso de um candelabro feito de garrafas de vidro, e de luminárias que reciclam funis e outros objetos do quotidiano da velha moagem. A mais comprida das mesas e o balcão do bar são feitos de madeiras antigas da casa. «Quisemos recriar a entrada tal como era nos tempos antigos», diz Rita Belo. No andar de cima há uma mezzanine (o termo arquitetónico correto é sobrado). «Temos um lounge que tem funcionado como sala de estar, as pessoas trazem os computadores e talvez possa nascer aqui um espaço de coworking». Um pormenor interessante é uma chaminé, que aproveita «o exaustor que aspirava as cascas, restos de cereais e poeiras. À medida que vieram mais pessoas morar para esta rua, o sistema deixou de ser utilizado. Temos algumas das máquinas antigas guardadas» e um dia poderão vir também a ser uma atração. A associação mantém um outro espaço, o Celeiro, mesmo em frente, no qual funcionam as atividades de grupo, como o yoga.
Moagem
Rua João Dias Mendes, 13-14
8670-086 Aljezur – Portugal
Assuntos Gerais [email protected]
Eventos/Propostas [email protected]
Mó Bistrô [email protected]
Reserva de Mesa: 925 289 246
Horário:
Aberto diariamente das 10h às 23h.
Terças: aberto das 18h às 23h.