No final do séc. XV, os monarcas espanhóis e portugueses perseguiram e expulsaram milhares de judeus da Península Ibérica, obrigando-os a procurar refúgio em muitos outros países europeus.
Volvidos mais de cinco séculos sobre aquilo que muitos descrevem como tendo sido um «erro histórico», Portugal e Espanha adotaram várias medidas no sentido de ser concedida nacionalidade, por naturalização, aos descendentes de judeus sefarditas.
No caso português, a concessão de nacionalidade aos descendentes de judeus sefarditas foi introduzida por meio do Decreto-Lei n.º 30-A/2015, que veio alterar o Regulamento da Nacionalidade Portuguesa.
Apesar do processo de naturalização ser tendencialmente simples e menos exigente quando comparado ao processo estabelecido em Espanha, até 2016, apenas haviam sido solicitados cinco pedidos de concessão de nacionalidade com base no referido decreto, fazendo denotar o pouco interesse da comunidade judaica em restabelecer a ligação histórica com Portugal.
Porém, com o advento do Brexit, o número de pedidos aumentou para cerca de 500, desvendando um súbito interesse na aquisição da cidadania portuguesa.
A razão é mais ou menos óbvia: sendo que o Brexit implica que os cidadãos britânicos deixem de beneficiar dos direitos e liberdades de que os cidadãos dos Estados-Membros da União Europeia gozam, nomeadamente ao nível da liberdade de circulação no seio da comunidade europeia, a obtenção de cidadania portuguesa surge como uma necessidade.
Mais evidente se tornam as motivações por detrás destes pedidos, quando se observa que a grande maioria destes pedidos provêm de cidadãos britânicos.
Num outro sentido, a corrida à obtenção da cidadania portuguesa permitiu que muitos negócios florescessem, sobretudo, aqueles que se relacionam com o apoio jurídico e administrativo.
Segundo o jornal «The Economist», tais processos podem ascender aos vários milhares de euros por pessoa, e tendo em conta a exigência do processo adotado em Espanha, a obtenção de cidadania portuguesa tornou-se numa opção mais viável e apetecível.
Neste sentido, a dívida histórica para com a comunidade judaica tornou-se numa dádiva histérica por parte do Estado português, onde a «ligação histórica» mais não é que um pretexto para gerar receitas em torno da concessão (ou venda) da nacionalidade portuguesa.
Diogo Duarte | Jurista, Formador, Investigador, Colunista